domingo, 26 de setembro de 2010

Crise Política / Riscos Acrescidos


A actual crise política nacional provocada pelos líderes dos dois partidos com maior representação legislativa, pode e vai ter, se não for evitada, consequências dramáticas e profundas no agravamento da situação económica e financeira que o país atravessa.
Ninguém terá dúvidas que ambos, Sócrates e Passos Coelho, têm perfeita consciência das consequências negativas para o país do seu desentendimento. Mas infelizmente para nós, para eles outros interesses se sobrepõem, a ambição política de cada um deles e o interesse partidário.
O PS de Sócrates sabe que têm em mãos uma armadilha governativa. Se optar por baixar o défice, tal como se obrigou com o PEC, corre o risco de colocar novamente a economia do país em recessão técnica. Não cumprindo o défice público prometido, as dificuldades em aceder à poupança externa serão cada vez maiores e os juros a pagar tornar-se-ão incomportáveis.
Nesta conjuntura, o PSD não tem pressa em chegar ao poder. Enquanto estiver na oposição, sabe que a maior responsabilidade política da situação do país cabe a outros. Por um lado não quer aproximar-se demais do governo, para que o eleitorado não lhe venha a atribuir também responsabilidades pelo desaire, mas como também não quer ser acusado de falta de colaboração política, vai dando recados ao Primeiro-ministro através dos meios de comunicação social.
O PS não cumpriu a reforma da administração pública conforme havia prometido ao eleitorado. Teve uma entrada de rompante, mas cedo esta se desvaneceu. Não teve a coragem política para fazer as reformas enquanto esteve em estado de graça governativo, por isso também não as vai fazer agora, até ao final da legislatura. O tão desejado abaixamento na despesa corrente primária, a verificar-se na execução orçamental actual, só será feito através de medidas temporárias e de oportunidade, tais como o congelamento de salários e o não pagamento do subsídio de Natal aos funcionários públicos.
Passo Coelho joga as cartas que pensa ter. Ao aproximar-se a data de discussão do próximo orçamento, iniciou a estratégia de apertar o cerco ao governo, pressionando cada vez mais Sócrates a agir no corte orçamental pelo lado da despesa, dizendo que não irá viabilizar um orçamento que preveja o aumento da mais carga fiscal sobre os portugueses. Na sua óptica, no mínimo conseguirá que o PS saia mais fragilizado perante o eleitorado, deixando-lhe o caminho livre para vencer folgadamente as próximas eleições. Na minha óptica, deitará a primeira mão cheia de terra na sua própria sepultura, enquanto líder político.
Estas guerrilhas de poder, efectuadas à margem dos interesses soberanos da Nação, revelam o baixíssimo nível a que chegou a vida política nacional. Numa altura em que todos deviam dar as mãos e arregaçar as mangas, vão dar tudo a perder. Para eles, para os irresponsáveis, será sempre mais fácil a desresponsabilização pessoal e corporativista feita à custa do adversário.
Mas os portugueses desta vez, não vão desculpar quem os está a colocar em tão difícil situação de empobrecimento colectivo, a decidir certamente pelos senhores do FMI que não tardarão a instalar-se em Portugal.

Emissão de divida pública portuguesa. Maturidade do empréstimo a 10 anos.


Nas últimas semanas temos assistido a uma resposta positiva dos mercados, no que se refere à procura de obrigações do tesouro da República Portuguesa. Mas como não à bela sem senão, para além da procura se ter verificado maior que a oferta, a última operação saldou-se por uma yield superior a 6% para maturidades de 10 anos.
Sendo o risco de incumprimento da dívida soberana ainda reduzido ( a Standar & Poor`s baixou recentemente o rating de Portugal dois níveis, de A+ para A-), o que terá levado a esta alteração de comportamento por parte dos mercados financeiros que está obrigar a República Portuguesa a pagar taxas de juro tão elevadas?
O excesso de procura em relação à oferta de títulos de dívida pública portuguesa é revelador que os investidores acreditam que vão ser reembolsados futuramente dos montantes emprestados. Tudo leva a crer que se está a verificar um movimento especulativo dos investidores sobre as nossas necessidades de financiamento. Estes não são alheios à fragilidade da economia portuguesa e à sua avidez de poupança externa, e vão fazendo o jogo que melhor rendimento lhes trás.
Mas é preciso que os portugueses compreendam a razão do país se encontrar em tão grave posição de fragilidade económica e financeira. Passo a citar algumas das mais importantes:
• Há alguns anos a esta parte (antes da crise económica e financeira mundial de 2008), têm-se verificado um crescimento anémico do PIB. Analisando os indicadores macroeconómicos do país, também se percebe facilmente que não existem expectativas de curto/médio prazo para que a situação venha a melhorar. Existem deficiências estruturais profundas no tecido económico nacional, nunca corrigidas ao longo das sucessivas legislaturas.
• Nas últimas duas décadas o investimento público tem priorizado a construção de infra-estruturas viárias e no betão em detrimento do investimento que ajudasse a desenvolver capital humano e físico mais ajustado à melhoria da sua competitividade externa, na produção de bens e serviços transaccionáveis. Não o fez e deste modo não se preparou para fazer face à concorrência crescente dos mercados internacionais, nomeadamente dos mercados emergentes asiáticos, onde a mão-de-obra é ainda muito mais barata que a nossa.
• Baixa produtividade. O PIB per capita dos portugueses cifra-se em 65% dos UE15 (15 mais ricos da UE) e cerca de 55% dos países mais desenvolvidos.
• Aumento do desemprego. A criação de riqueza no país não tem sido capaz de inverter o balanço negativo entre os postos de trabalho que se vão criando e os que se vão perdendo. Esta inversão só será possível um dia quando o PIB volte a crescer acima de 3% ao ano. Essa meta não será fácil de atingir durante as duas próximas legislaturas.
• Incapacidade dos sucessivos governos da nação promoverem reformas estruturais que, por um lado potenciassem a diminuição drástica do peso do estado na economia e por outro aumentassem a produtividade dos recursos existentes, de forma a melhorar a sua competitividade.
• Elevada dependência de financiamento externo, devido a um elevadíssimo défice de poupança interna.
• Ausência de planos estratégicos a longo prazo para todos os sectores da economia.
• Grande dependência energética externa. Metade do nosso défice externo provém de despesas de importação de energia.
• Sistema de justiça complexo e processualmente demorado, com uma imagem marcada fortemente por estas duas premissas. Por esta razão e pela falta de flexibilidade da legislação laboral, assiste-se ao afastamento do investimento estrangeiro e também nacional para outros mercados.
Por último, acrescenta-se que os investidores financeiros têm consciência que o controlo do défice público português para equilíbrio das contas públicas do país, tão necessário à restituição da credibilidade externa, exige medidas governativas antagónicas das que importava lançar para estimular a economia.
Para atingir o objectivo do controle do défice é preciso reduzir a despesa, o investimento e eventualmente também aumentar a carga fiscal, para estimular a economia era preciso fazer precisamente o contrário de tudo isto.
Serrone