domingo, 29 de março de 2009

A China não Cresce sem a Globalização


Com 1,3 mil milhões de habitantes, a China é o maior país do mundo, é a economia que cresce mais depressa, é o maior produtor mundial industrial, é o segundo país em termos de consumo e o que têm a maior poupança.
Durante os últimos trinta anos, o PIB cresceu a taxas superiores a 9% ao ano, tirando da pobreza 400 milhões de pessoas. O rendimento médio por habitante aumentou quase sete vezes. Durante as três décadas a dimensão da economia duplicou em cada oito anos. Ante do início da actual crise internacional, a China exportava num só dia mais do que exportou no ano 1978, ano em que Deng Xiaoping iniciou o caminho da modernização. Na segunda metade desse mesmo período, só para os Estados Unidos, as exportações aumentaram 1600 por cento. A China tem o maior volume de depósitos bancários do mundo. As suas reservas de dívidas ascendem a 1,5 biliões de dólares, o que é três vezes mais do que os depósitos existentes em toda a União Europeia. A China entrou na globalização dos mercados, tornando-se um dos países mais abertos ao mundo. As exportações até meados de 2008, representavam um terço do seu PIB. Este país possui bastante mão-de-obra, mas por outro lado têm carência de matéria-prima e bens alimentares, pelo que não têm alternativa e recorre à sua importação, garantindo no entanto que a balança de transações lhe seja sempre favorável.
Nos últimos anos a China, juntamente com os Estados Unidos, formaram o par de países que mais contribui para o crescimento da economia internacional, razão pela qual, em tempo de crise profunda, torna-se imprescindível estarmos atentos ao que por lá se vai passando. As previsões económicas para 2009, estimam que o crescimento do gigante asiático se vá situar em 6,57 % segundo a FMI e em 8% do PIB segundo o governo. Este último valor, bem longe dos valores de crescimento do PIB dos últimos anos (na casa dos dois dígitos), é considerado pelo primeiro-ministro Wen Jiabao, o valor mínimo para garantir a paz social. Os dados recentemente conhecidos, indicam ainda que no mês de Janeiro de 2009, as exportações totais caíram 17,5%. Na realidade cem mil fábricas fecharam as portas e 20 milhões de desempregados, não tiveram outra alternativa do que deixar as cidades e regressar às zonas rurais de origem. O ritmo da produção industrial no final de Dezembro de 2008, era inferior três vezes ao ritmo de produção que se verificava no princípio desse ano. No caso da China, foi a quebra da procura externa que foi a causadora principal desse mega abrandamento. Dispondo de elevada liquidez, Wen Jiabao tenta agora contrariar a tendência recessiva lançando um pacote de estímulo económico de 586 mil milhões de dólares para os próximos dois anos. Destina-se essencialmente a ser gasto em infraestruturas e a criar formas de incentivo ao consumo, procurando-se com isso que o mercado interno possa substituir parte da quebra da procura do mercado externo, enquanto a crise internacional durar.
A China desenvolveu a sua economia ajustando-se ao modelo da globalização, por isso duvido que este país volte a crescer significativamente, sem antes se verificar também a retoma da procura dos seus excedentes por parte dos mercados internacionais. Seguindo o exemplo de diveros países, a China lançou pacotes de estímulos internos para enfrentar a crise e tal como se tem passado nos outros estados, as medidas daí resultantes têm sido praticamente orientadas para a produção e consumo interno de bens, produtos e serviços, portanto com fraca projecção no mercado externo. Como se sabe, estes estímulos têm como objectivo principal a manutenção do emprego de modo a evitar o crescimento de problemas sociais. São medidas tomadas para atenuar os efeitos e as causas resultante da "passagem" da crise e não, como alguns possam pensar, medidas encontradas para a solução dos problemas e a viabilização da recuperação económica internacional. Essa recuperação económica está longe de acontecer e a China, provavelmente, sendo um dos países com maior capacidade para conseguir sair da crise, irá sentir-se condicionada nos próximos anos, mais por factores de natureza externa do que interna.

Serrone

quarta-feira, 25 de março de 2009

SINAIS DA AMÉRICA

Muito provavelmente o dia 26 de Fevereiro de 2009 ficará marcado para a história dos Estados Unidos e do resto do mundo, como o dia em que as mudanças de que vos falei na última crónica, tiveram simbolicamente o seu início.

Impõem-se a seguinte pergunta: - O que aconteceu nesse dia que possa ser assim tão importante?
O presidente Obama discursou perante as duas câmaras do Congresso colocando a questão da maior igualdade social na agenda política. O que ele disse aos americanos é que “uma melhor redistribuição da riqueza é essencial para concertar uma economia doente”. Anunciou o recurso a politicas públicas para tornar acessível os cuidados de saúde e facilitar as condições de acesso à educação, a todos os americanos. Falou em aumentar os impostos sobre os mais ricos e propôs a utilização dos dinheiros dos contribuintes para fomentar o novo “paradigma da economia verde”. Afirmou ainda que era tempo da sociedade começar a olhar para o Estado de outra maneira, rejeitando a ideia que os problemas se resolveriam por si mesmos e que era preciso ter um governo com acções fortes e de grandes ideias. A determinada altura fez a seguinte pergunta ao Congresso: -“Os americanos estão preparados para esta viragem?”. Esta ideia forte de mudança que marcou o discurso de Obama, traduz-se numa maior sensibilidade para os valores sociais, ambientais e culturais e para a necessidade de aumentar o papel do Estado na construção dos alicerces de uma nova prosperidade comum.
O debate político está lançado nas elites americanas e o mundo assiste ansioso, à espera de novos valores para a globalização. Se Obama vencer a grandiosa batalha interna que tem pela frente, o mundo acabará por seguir o seu exemplo e a humanidade poderá voltar a sentir esperança num futuro mais próspero e menos assimétrico para todos.

Ideologias, teorias ou simplesmente ideias?
Apesar da insistência dos jornalistas, Obama não aceita responder directamente a perguntas feitas com o intuito de identificar qual é a sua filosofia política. Entendemos que não responda porque não quer com isso criar qualquer tipo de clivagens na sociedade americana. Ele sempre afirmou que pretende envolver toda a nação no processo de mudança e que quer fazer renascer no povo o espírito do sonho americano.
Mas nós podemos e devemos ir tentando encontrar algumas dessas respostas. Não é importante saber se as suas politicas são menos à direita e mais à esquerda ou se as suas ideias são mais identificadas com o socialismo ou com a social-democracia. O que é verdadeiramente relevante é perceber qual é o fio condutor dessas políticas e o impacto que elas poderão ter no futuro da América e do mundo.
Obama sabe perfeitamente que a actual situação de crise profunda que o mundo assiste foi causada pela teoria dos Mercados Eficientes e a doutrina fundamental do laissez –faire que a acompanha, adoptada pela América e copiada pelo mundo após a Segunda Guerra Mundial. Não será pois de estranhar que Obama comece a dar ao estado um papel de maior intervenção, muito ao estilo das teorias propostas por Keynes. Em que medida é que o vai fazer, ainda ninguém sabe ao certo. Por isso é ainda muito cedo para se tirarem mais conclusões. Temos que esperar pelas cenas dos próximos capítulos, sendo no entanto certo que a mudança já teve o seu início, marcada simbolicamente no dia 26 de Fevereiro de 2009.

Serrone, 25 de Março de 2009